Territórios do cárcere: a realidade do Complexo Penitenciário Nelson Hungria
Alexandre-Magno-Alves Diniz. Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, Belo Horizonte, Brasil.
Victor Oliveira. Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, Brasil.
Thais Duarte. Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, Brasil.
Ludmila Ribeiro. Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, Brasil.
resumo | Este artigo analisa os territórios estabelecidos no Complexo Penitenciário Nelson Hungria, unidade prisional inicialmente projetada como de segurança máxima, voltada a presos do sexo masculino e situada na Região Metropolitana de Belo Horizonte (Minas Gerais, Brasil). O objetivo é revelar como se constrói a geografia carcerária dessa unidade e de que maneira ela termina por refletir as dinâmicas de sociabilidade na prisão. Para tanto, utilizamos de dados da observação dos espaços da unidade, entrevistas com diferentes tipos de atores (como funcionários da administração prisional e presos), além da criação de plantas sobre os lugares e mapas que indicam como eles são ocupados por determinados indivíduos. Os distintos territórios estabelecidos no Complexo Penitenciário Nelson Hungria produzem e reforçam identidades, muitas das quais são estabelecidas pelos presos em conjunto com agentes estatais.
palavras-chave | geografia social, segregação, violência.
abstract | This article analyzes the territories established in the Nelson Hungria Penitentiary Complex, a prison unit initially designed as maximum security, aimed to house male prisoners, located in the Metropolitan Region of Belo Horizonte, Minas Gerais, Brazil. The aim is to reveal how the prison geography of this unit is constructed and how it ends up reflecting sociability dynamics in prison. Therefore, we used data obtained through the observation of the prison unit’s spaces, interviews with different types of actors (such as prison administration officials and prisoners), in addition to the elaboration of blueprints and maps that indicate how the spaces are occupied by individuals. The distinct territories established in the Nelson Hungary Penitentiary Complex produce and reinforce identities, many of which are established by prisoners together with state agents.
keywords | social geography, segregation, violence.
Recebido em 27 de janeiro de 2021, aprovado em 4 de junho de 2021.
E-mails: A. Diniz, alexandrediniz@pucminas.br | V. Oliveira, victorneivaeo@gmail.com | T. Duarte, thaisld@ufmg.br | L. Ribeiro, lmlr@ufmg.br
Introdução
O Brasil detém o terceiro maior número absoluto de reclusos no mundo (678.506 mil presos) (World Prison, 2021). Enquanto a taxa de encarceramento mundial é de 145 detidos por 100.000 habitantes, a taxa brasileira é de 323 por 100.000 habitantes, 146% superior à média global (World Prison, 2021). Para encarcerar todo esse contingente, o país conta com mais de 1.400 unidades carcerárias (Departamento Penitenciário Nacional [DEPEN], 2021), majoritariamente administradas pelos 26 estados da federação, além do Distrito Federal. Ainda que, desde 2006, o Brasil tenha seis unidades federais, localizadas em distintas unidades da federação, essas encarceram somente 668 presos. Ou seja, a enorme maioria de indivíduos privados de liberdade está sob guarda dos sistemas penitenciários estaduais, fazendo com que existam 28 sistemas penitenciários, marcados por grandes discrepâncias em termos de infraestrutura, disponibilidade de serviços (como saúde, educação, assistência e trabalho), além de perfis criminais (Ribeiro & Diniz, 2020). Em geral, as unidades prisionais são superlotadas, operando, em média, 66% acima da sua capacidade (DEPEN, 2021).
O sistema penitenciário brasileiro é conhecido internacionalmente pelas várias violações cotidianas de direitos humanos, incluindo as rebeliões recorrentes que resultam em diversas mortes e a presença crescente de organizações criminosas (Manso & Dias, 2017). Em parte, isso se deve ao enorme crescimento da população prisional nas últimas décadas. Em 1990, a taxa de aprisionamento era de 61 presos por 100.000 habitantes, alcançando seu patamar mais elevado em 2019 (359 por 100.000 habitantes) (DEPEN, 2021). As razões para este significativo aumento estão situadas, de um lado, nas políticas de segurança pública, muito voltadas para as prisões em flagrante, que aumentam o quantitativo de presos provisórios, que hoje respondem por 1/3 dos encarcerados (Cunha, 2020). De outro lado, está a lei de drogas aprovada em 2006, que deixou nas mãos dos policiais a diferenciação entre tráfico e uso, sendo que para essa distinção não interessa a quantidade de drogas, mas “as circunstâncias sociais e o local da infração”. Essa lei levou para a prisão um contingente sem precedentes de jovens (homens e mulheres) negros (Azevedo & Cifali, 2015).
As mudanças no sistema prisional, em termos de quantidade de pessoas e condições de encarceramento, têm despertado a atenção de acadêmicos (Lourenço & Alvarez, 2018). Adorno (1991) realizou um primeiro esforço de mapear quais pesquisas teriam se atentado à temática, indicando que alguns desafios deveriam ser superados de modo a qualificar os debates sobre o sistema carcerário nacional. O primeiro dizia respeito ao tratamento teórico fornecido ao tema, já que eram mobilizadas as perspectivas foucaultianas gofmanianas, adequando-as sem críticas ao contexto brasileiro. Um segundo desafio consistia na ausência de dados qualificados para pensar o mundo do crime dentro das unidades prisionais, ou questões relativas à ação governamental na área prisional (Ramalho, 1983). A revisão feita por Salla (2006) verificou que inexistiam investigações comparativas (entre o Brasil e cenários internacionais), sendo que as pesquisas sobre prisões se centraram, sobretudo, numa agenda mais tradicional, circunscrita a temas como trabalho, educação e ressocialização. Seriam escassas as análises sobre as relações de poder no interior dos cárceres, a construção de grupos e identidades, as chamadas gangues prisionais, os movimentos de revolta e rebeliões, bem como as interlocuções entre as instituições penais e o mundo exterior.
Recentemente, Lourenço e Alvarez (2018) sublinharam que, na última década, surgiram muitos estudos sobre as diversas dinâmicas de poder dentro e fora das prisões, enfocando-se, entre outros aspectos, a ação de grupos criminais nascidos nos cárceres, como seria o caso do Comando Vermelho, do Rio de Janeiro,1 e do Primeiro Comando da Capital (PCC), de São Paulo.2 Inclusive, observa-se hoje o enorme predomínio de análises sobre o PCC e de outros grupos que se multiplicaram às margens do Estado, compondo o que se poderia chamar de uma experiência etnográfica sobre as prisões (Telles, 2013).
Nesses levantamentos, um aspecto ainda é negligenciado: a dimensão espacial e territorial das prisões. Quase não há estudos brasileiros sobre a questão (Arruda, 2017), em que pese a sua importância no contexto internacional (Moran et al., 2012). A maneira como o espaço é organizado e transformado em território impacta as relações sociais travadas dentro de uma prisão, o que limita desde a possibilidade de cooptação de novos membros para grupos criminais até o acesso a bens legais e ilegais (Moran, 2012, 2013a). Dentro das unidades prisionais brasileiras, não raro, a proximidade com o prédio da direção, a possibilidade de residência em pavilhões com melhores condições de vida ou o encaminhamento a espaços designados a grupos criminais são determinantes das regras e dos recursos que o preso acionará ao longo do cumprimento de sua pena (Ramalho, 1983). Considerando tal lacuna, este artigo visa analisar como se constrói a geografia carcerária numa unidade prisional brasileira.
A Geografia Carcerária foi o termo cunhado por Moran et al. (2012) para descrever o conjunto de trabalhos voltados ao estudo das espacialidades da detenção e do aprisionamento, que buscam explorar as práticas de encarceramento, com foco nos espaços carcerários. Tais pesquisas procuram compreender como se dá a distribuição espacial das pessoas dentro das unidades de privação de liberdade e de que maneira a constituição de territórios influi e determina relações sociais. Na acepção de Moran (2013a), é uma interseção entre Geografia, Criminologia e Sociologia, que permite vislumbrar como o ambiente prisional não é apenas um espaço geográfico (físico), mas produto de dinâmicas sociais e relações de poder entre diferentes atores (presos, guardas, direção), o que leva à conformação de microterritórios, que impactam diretamente no modo como a experiência prisional é vivenciada.
Neste artigo, procuramos compreender como se constrói e se revela a geografia carcerária do Complexo Penitenciário Nelson Hungria (CPNH), situado na Região Metropolitana de Belo Horizonte (RMBH), em Minas Gerais. Essa unidade foi escolhida por ser um microcosmo das práticas de encarceramento de Minas Gerais. Este é o estado brasileiro que mais se aproxima das condições gerais do país, com 62.912 presos (uma taxa de encarceramento de 297 por 100.000 habitantes) e 223 unidades prisionais, que, a exemplo do restante do Brasil, apresenta expressiva superlotação, com uma relação de 1,5 presos por vaga (DEPEN, 2021).
O Complexo Penitenciário Nelson Hungria é uma das maiores unidades mineiras, alojando, aproximadamente, 2.200 presos, apesar de ter capacidade para 1.600. Construída na década de 1980, se destaca por conter as principais características que definem o sistema prisional brasileiro: superlotação, presença crescente de organizações criminosas, rebeliões recorrentes e várias violações de direitos humanos (Ribeiro et al., 2019). Além disso, foi durante muitos anos a única prisão do estado que recebeu internos nomeados como integrantes do PCC, o que a aproxima dos vários outros estabelecimentos que também contam com a presença dessa organização no país (Manso & Dias, 2017). É, portanto, um estabelecimento que acomoda uma variedade de indivíduos, espaços e territórios.
Visando compreender como se organizam os territórios no âmbito do CPNH, realizou-se extenso trabalho de campo, contemplando a observação das dinâmicas carcerárias, o acesso aos espaços da unidade, somado aos relatos obtidos de presos e de funcionários sobre o cotidiano do estabelecimento prisional. A partir de tais dados, este texto busca indicar cartograficamente os territórios, trânsitos e movimentações de pessoas naquele espaço prisional e demonstrar que a mobilidade dos atores (sejam eles presos ou trabalhadores penais) revela as dinâmicas de sociabilidade e as relações de poder instauradas na unidade, configurando-a em um território.
Territórios e prisões
Partimos da Geografia Carcerária para entender como o espaço intermedia e orienta as interações entre os indivíduos que compõem a cena prisional (presos e funcionários do cárcere), transformando o espaço numa categoria em disputa (Moran, 2013a), ou seja, num território. Tal termo é “definido e delimitado por e a partir de relações de poder” (Souza, 1995, p. 78), distinguindo-se da noção de espaço que representa a base sobre a qual os territórios são construídos (Raffestin, 2009). Assim, um agente territorializador projeta sobre o espaço trabalho e energia, criando territórios nos quais suas necessidades e desejos são garantidos, criando um campo de forças, uma dimensão do espaço social, que apresenta tanto aspectos intangíveis quanto palpáveis (Souza, 2009, p. 60).
A polarização entre atores hegemônicos e hegemonizados na dialética da construção de espaços de poder é intrínseco aos territórios. Santos et al. (2000) revelaram que, para os atores hegemônicos, o território apresenta forte conteúdo funcional, significando controle físico, valor de troca, lucro e fonte de recursos. Para os atores hegemonizados, o território representa um abrigo, combinando funcionalidades (garantia de sua sobrevivência material) e identidade (sobrevivência simbólica). Portanto, todo o território é simultaneamente funcional e simbólico, uma vez que os atores territorializadores o utilizam como suporte para realizar funções e produzir significados (Souza, 1995, 2009).
Como o processo de territorialização pode levar à privação de acesso a recursos e riquezas no espaço, bem como à negação desses a certos grupos ou indivíduos, argumentamos que as prisões reproduzem a lógica de dominação e de exclusão que rege o espaço urbano na sociedade brasileira. No território prisional, convivem múltiplos e variados microterritórios, cuja efemeridade e extensão são resultantes de contínuas disputas entre atores diversos, que exercem entre si (e com o espaço das prisões) complexas relações de poder (Souza, 1999, p. 83). Essas dinâmicas são manifestas, de forma concreta, na arquitetura dos pavilhões carcerários, nos muros, nas celas e nas guaritas, e, de forma simbólica, nos códigos comportamentais e no significado atribuído a certos objetos (Moran, 2013a).
A Geografia Carcerária é um campo que dispõe, no plano internacional, de algumas iniciativas importantes (Mitchelson, 2012; Moran, 2013a; Moran & Piacentini, 2011; Moran et al., 2013; Moran et al., 2018; Zomighani Jr., 2013), que exploram escalas espaciais mais amplas. Isto é, trabalharam sistemas prisionais e o contexto urbano onde as unidades estão inseridas, ignorando, por vezes, o espaço interno das prisões. Atenta a essa questão, Moran (2013a) conferiu centralidade à espacialidade carcerária, verificando, por exemplo, como a mobilidade de atores no interior dos cárceres e as identidades são construídas com base no espaço.
A Geografia Carcerária questiona a noção clássica de instituição total de Goffman (2007), ao identificar que os muros das prisões são porosos, articulando relações familiares, agentes dos Estado e presos, além de tramas legais e ilegais (Moran, 2013b). Como descrito por Cunha (2020), cuja pesquisa se pautou em etnografia em diversas prisões, os ambientes de visitação, por exemplo, são espaços que estabelecem relações significativas entre o fora e o dentro das prisões. Com efeito, desestabilizam identidades e regras formalmente pactuadas no contexto prisional, fazendo com que a sociabilidade penal deixe de estar circunscrita ao cotidiano institucional, para se estender aos bairros onde residem os familiares dos prisioneiros. Gill et al. (2018) constataram que a formação de três tipos de circuitos: i) de pessoas, que englobam os movimentos dos diferentes atores na unidade prisional; ii) de objetos, compostos por cartas, memorandos, ofícios, bilhetes, livros, itens de higiene pessoal e comida; iii) e de práticas, que incluem o conjunto de ideologias (“reabilitação” ou “segurança”) e/ou políticas que orientam as práticas organizacionais no interior das prisões. Tais circuitos afetam, entre outros aspectos, a passagem do tempo no ambiente prisional e o modo como as pessoas levam suas vidas.
No Brasil, são raros os estudos que se voltam à compreensão da Geografia Carcerária. Dentre os existentes, chama a atenção o de Souza (1999) que teorizou sobre quatro tipos ideais de territórios prisionais. O primeiro seria destinado aos funcionários da administração interna da prisão, representando o mais importante e estratégico dos espaços. Nele são tomadas decisões sobre o funcionamento da unidade e são arquivados os documentos referentes aos atores locais, como funcionários e presos. É restrito, vedado aos custodiados e aos funcionários sem vínculo direto com a administração. Um segundo espaço seria formado pelos territórios de circulação interna, onde se estabelecem conexões entre os ambientes internos da prisão, representados por corredores, rampas, escadas e caminhos de acesso. São cobiçados pelos presos por conferirem a sensação de liberdade, mas são abertos aos funcionários e restritos à maioria dos presos, exceto àqueles que conquistaram a confiança da administração da unidade prisional e transitam para exercer alguma atividade de interesse da prisão. Um terceiro espaço seria o de controle, normalmente previsto nos projetos arquitetônicos dos estabelecimentos. São os pontos estrategicamente edificados, que regulam a entrada e a saída de presos, agentes e visitantes, além de supervisionarem as atividades exercidas nos demais espaços da prisão. Consubstanciam-se sob a forma de torres e de guaritas, restritos a um grupo específico de funcionários. Por fim, os territórios do cárcere são aqueles onde os presos permanecem durante boa parte do tempo. São sua referência espacial, sua casa, materializados sob a forma de celas e pátios de banhos de sol. São locais impregnados de significados e sentimentos, mas também sujeitos a disputas, muitas vezes mediadas pelas trocas (legais e ilegais) estabelecidas entre os presos.
Partindo da categorização de Souza (1999), outros dois estudos procuraram aprofundar o entendimento da conformação da geografia carcerária no Brasil. Almeida (2014), a partir de uma investigação desenvolvida no Centro de Ressocialização de Cuiabá (Mato Grosso), analisou detalhadamente a territorialização das alas e dos espaços de circulação. Sua pesquisa revela o poder das Igrejas Evangélicas no controle dos territórios e da conduta dos presos, além de sublinhar a forte hierarquia estabelecida entre grupos de custodiados, que disputam com as igrejas o controle dos espaços internos do estabelecimento.
Já Arruda (2017) escrutinou os estabelecimentos prisionais pernambucanos, demonstrando como o comportamento das pessoas privadas de liberdade em diferentes momentos de sua rotina é territorializado. O autor ressaltou, por um lado, os privilégios associados à circulação interna exercidos por certos presos, com destaque para aqueles responsáveis pela limpeza. Por outro, demonstrou como as prisões são territórios reprodutores de desigualdades, tendo como elemento estruturador a venda de celas, que determinaria a posição espacial do sujeito. Logo, a condição socioeconômica do preso seria determinante à sua qualidade de vida, posto que alguns espaços da prisão, a partir de uma teia que entrecruza o legal e o ilegal, determinam desde o acesso a bens básicos (de higiene e alimentação) até serviços (como saúde, educação e trabalho).
Partindo dessas referências, pretendemos compreender como o espaço interno do CPNH encontra-se organizado e de que maneira intermedia ou determina as relações de sociabilidade. As perguntas que gostaríamos de responder neste texto são as seguintes: Quais são os principais agentes territorializadores? Como eles negociam e projetam poder sobre os espaços presos? Antes de desenvolver essas questões, iremos indicar os passos trilhados em campo para a coleta de dados.
Notas metodológicas
A pesquisa no Complexo Penitenciário Nelson Hungria (CPNH) foi financiada pelo CNPq (processo 445545/2014-3) e autorizada pelo Comitê de Ética em Pesquisa da UFMG (Certificado de Apresentação de Apreciação Ética [CAAE] 47198415.30000.5149). Este projeto foi realizado entre 2015 e 2019, sendo organizado em três etapas, que desvelaram processos territoriais ocorridos no local em diferentes momentos, não necessariamente díspares entre si. Em cada etapa desenvolveu-se tanto um esforço de observação dos espaços da unidade quanto conversas semiestruturadas com presos e funcionários penais. A primeira atividade permitiu delimitar e compreender os diferentes ambientes que compõem a CPNH; já a segunda possibilitou analisar as narrativas de diferentes atores sobre as dinâmicas e as segmentações territoriais estabelecidas nos distintos espaços carcerários.
Na primeira fase, entre 2015 e 2016, a unidade foi visitada mensalmente por dois pesquisadores, que buscaram entender a sua rotina e as regras subjacentes às divisões espaciais entre presos e agentes penitenciários. Essa fase foi eminentemente exploratória, contando com quatro agentes e quatro presos entrevistados, dadas as restrições de circulação e de comunicação estabelecidas no local em decorrência de seu status de unidade de segurança máxima à época da pesquisa (o que foi revertido já no ano de 2020).
Na segunda etapa do estudo, entre 2016 e 2018, as visitas foram semanais e, com isso, foi possível coletar depoimentos de presos com os seguintes perfis: i) 25 custodiados rotulados como filiados ao PCC, encarcerados em dois pavilhões específicos; ii) 23 integrantes de outras “organizações criminais”, que estavam em outras alas; iii) oito ex-profissionais de segurança pública, suspeitos ou condenados pela prática de delitos, encarcerados no pavilhão designado a esse público em especial.
Na terceira etapa, em 2019, foram realizadas mais 32 entrevistas semiestruturadas com atores que compõem a rotina da unidade. Dez foram conduzidas com funcionários, entre psicólogos, advogados, assistentes sociais, agentes de segurança e direção. Outras 17 se deram com presos rotulados pelo Estado como vinculados ao PCC (Duarte & Araújo, 2020). Por fim, foram ouvidos cinco custodiados de outros perfis, como ex-agentes de segurança pública, presos trabalhadores e aqueles com ensino superior.
Nessas diferentes fases da pesquisa, as conversas travadas com distintos atores do CPNH foram efetuadas voluntariamente, de modo que a equipe de pesquisa apresentava o estudo e questionava se certa pessoa tinha interesse em falar sobre o cotidiano da unidade. Os presos foram abordados nos pavilhões onde ficavam privados de liberdade ou em seus espaços de trabalho. Já os funcionários foram acionados através do método bola de neve, de modo que um primeiro entrevistado indicava outra pessoa com quem pudéssemos conversar e, assim, sucessivamente. Todos os diálogos realizados com os funcionários foram gravados e, posteriormente, transcritos. Por outro lado, a maioria das entrevistas com os presos não recebeu autorização para ser registrada. Apenas foi possível anotar os apontamentos no diário de campo que, ao fim do trabalho na unidade prisional, também foram classificados.
Para a organização dos dados, nos valemos da técnica de análise de conteúdo e criamos uma planilha de Excel para facilitar a organização dos depoimentos. Em cada coluna, tínhamos os temas que gostaríamos de abordar (como os critérios para a organização do espaço, a sociabilidade dos presos, a interação entre presos e agentes, dentre outros) e cada linha se tornou a opinião de cada uma das 96 vozes ouvidas sobre aquela categoria específica.
Somado a esse esforço, ao longo de toda a pesquisa, nos foi permitido circular pelo CPNH e realizar apontamentos sobre os seus espaços e dinâmicas espaciais. Percorremos diversos ambientes, examinando o comportamento dos presos e agentes prisionais. Utilizamos, assim, um formulário de observação como referência, que trazia uma quadrícula com a listagem de todas as edificações e espaços de circulação, sendo nele indicada a presença (ou ausência) dos atores que compõem a dinâmica socioespacial do presídio (funcionários e presos). Com base nos registros dessa observação sistemática e das anotações de campo, produzimos a planta baixa do CPNH e as representações cartográficas indicativas dos territórios do cárcere. Através dos dados obtidos via entrevistas e observação, procuramos descrever como se conforma a geografia carcerária do CNPH e quais são as relações de poder que delimitam os seus territórios.
O Complexo Penitenciário Nelson Hungria
Para entender como o CPNH se constitui em espaço ideal para a compreensão da Geografia Carcerária e das disputas simbólicas estabelecidas no território prisional, é preciso rememorar a sua história. No momento da pesquisa, a unidade possuía 12 pavilhões, além de quatro anexos, quase todos superlotados, haja vista que o estabelecimento estava 40% acima de sua capacidade (Duarte & Araújo, 2020). Esse é o ponto de chegada de uma história que interfere diretamente na maneira como são negociadas e projetadas as relações de poder sobre os espaços prisionais.
Na década de 1980, o sistema penitenciário mineiro passou por um grave período de ebulição. Em novembro de 1984, os presos da Penitenciária Agrícola de Neves (PAN)3 fizeram um motim para reivindicar melhorias na alimentação e revisão das medidas administrativas relacionadas à restrição de saídas regulares dos presos beneficiados pelo regime progressivo de pena (Paixão, 1991). No ano seguinte (1985), na Delegacia de Furtos e Roubos de Belo Horizonte, os presos passaram a escolher os companheiros de cela considerados mais fracos e os indicaram a serem mortos, prática conhecida nas cadeias como “ciranda da morte” (Paixão, 1991). A essa crueldade, somaram-se novos motins, tentativas de rebelião e assassinatos orquestrados por custodiados nas carceragens policiais, que assim denunciavam as condições aviltantes às quais estavam submetidos em decorrência da superlotação. Frente a essa crise, o governo estadual anunciou que iria construir uma penitenciária de segurança máxima: o CPNH (Paixão, 1991).
Inaugurado em 1988 com o propósito de desafogar as carceragens policiais e responder à emergência dos novos tipos de criminosos, em especial daqueles considerados de elevado perigo pela justiça, o CNPH foi a primeira prisão de segurança máxima em Minas Gerais (Ribeiro et al., 2004). Sua instalação significou um marco na política penitenciária do estado, consolidando o abandono do ideal de recuperação e a adoção do mote do controle, pautado por celas de confinamento solitário, regime de tranca e controle rígido dos comportamentos.
No governo de Itamar Franco (1999-2002) criou-se o Perspectiva, nome pelo qual ficou conhecido o Plano de Humanização dos Estabelecimentos Penitenciários de Minas Gerais. Tratava-se de programa composto por doze projetos, que teve como ênfase a preparação educacional, profissionalizante e social dos presos (que deveriam ser chamados de recuperandos), além da preocupação com a capacitação dos recursos humanos das unidades, especialmente os guardas (Minas Gerais, 2000). Em última instância, o Perspectiva tinha como objetivo a instalação de programas de educação, profissionalização e, em especial, a abertura e a liberalização dos ambientes prisionais (Oliveira, 2018). As ações visavam proporcionar oportunidades de trabalho e de estudo aos presos, maior controle dos gestores sobre o cotidiano prisional, redução da violência institucional perpetrada pelos agentes e criação de canais diretos de comunicação entre a administração e os detidos (Ribeiro & Cruz, 2002).
Para tornar essa interlocução mais eficaz, foi proposta a eleição de representantes de presos por pavilhões, que exporiam à direção da unidade os problemas cotidianos, as denúncias de tortura e as reivindicações de melhorias. No entanto, de acordo com o Relatório Final da Comissão Parlamentar de Inquérito da Assembleia Legislativa do Estado de Minas Gerais (2002), no lugar de serem escolhidos democraticamente pelos presos, os cargos de representação eram ocupados por antigas lideranças prisionais, que ascendiam a tais posições em razão do histórico criminal violento e do poder financeiro. Com isso, os supostos “representantes” eram, em sua maioria, chefes do tráfico de drogas. Tal problema se somou a outros três: a inexistência de um sistema de classificação interna dos presos determinado pelo staff; a ausência de separação da população prisional em celas ou pavilhões e a ampla liberdade de circulação pelos diferentes espaços da unidade, já que, sob a lógica da humanização, os presos não ficavam submetidos ao regime de tranca (Minas Gerais, 2002). Nesse quadro, os funcionários (guardas, assistentes e diretores) se mostraram avessos ao programa, que em sua visão poderia colocar em risco a segurança da penitenciária (Oliveira, 2018). Esse cenário de tensão gerou um contexto de suspeitas generalizadas, imprevisibilidade, conflitos e instabilidade, que desaguaram em seis rebeliões realizadas entre 2000 e 2001 no CPNH (Ribeiro & Cruz, 2002), além de denúncias relativas à intensificação do tráfico de drogas e à exploração sexual de pessoas menores de 18 anos, contribuindo para que a unidade não fosse percebida como de segurança máxima (Minas Gerais, 2002).
A situação piorava à medida que a população prisional crescia exponencialmente. Era agravada nos finais de semana, quando aumentava a circulação de pessoas externas ao cárcere, como visitantes e voluntários; bem como se avolumavam a entrada de objetos, como cestas com mantimentos, produtos de higiene pessoal e celulares. O frágil equilíbrio na unidade também se esgarçava com o acirramento das rivalidades entre grupos de presos, o que chamou a atenção da opinião pública e dos atores penais que começaram a pensar que a política até então executada dava sinais de falência (Ribeiro & Cruz, 2002).
Com a mudança de governo em 2003, a administração do cotidiano prisional começou a ser alterada de modo mais significativo, especialmente a partir da estruturação da Secretaria de Estado de Defesa Social (SEDS) e da Subsecretaria de Administração Prisional (SUAPI). Em oposição ao período de abertura proveniente da política de humanização, efetuou-se o chamado fechamento do sistema, inserindo a população prisional no regime de tranca (Oliveira, 2018). Para tanto, foi elaborado o plano mineiro do sistema prisional que previa, entre outras ações, a construção de novas unidades e a transferência gradativa dos presos das carceragens às penitenciárias (Sapori, 2007). A medida não foi de menor importância, pois, no começo dos anos 2000, menos de 30% dos encarcerados estavam sob a guarda do sistema prisional, ao passo que 70% estavam alojados em cadeias e delegacias da Polícia Civil (Ribeiro et al., 2004).
O CPNH foi alçado à posição de destaque no quesito segurança máxima. Para duplicar a sua capacidade, as celas projetadas para um interno passaram a receber dois. Foram construídos os anexos 1 e 2 e, em seguida, os anexos 3 e 4, projetados para presos do seguro (estupradores/ameaçados de morte), que não ficavam próximos uns dos outros por razões de segurança. A unidade ganhou espaços de trabalho, como fábricas de bola, espeto, gesso e produção de artesanato, além de novas salas de aula. Os presos sem ocupação eram mantidos em suas celas 23 horas por dia, saindo apenas uma hora para o banho de sol (Couto, 2011). Foram instituídos também locais para os membros do staff, como portaria, grupo de intervenção rápida, guaritas de vigilância, diretoria, núcleo de atendimento psicossocial e de censura, nos quais os presos não poderiam entrar de forma alguma (Ribeiro et al., 2019).
Em suma, ao longo dos anos 2000, o espaço prisional do CPNH se especializou, passando a contar com territórios definidos para cada público, segundo seu perfil criminológico e as percepções dos gestores sobre a demanda de garantia da ordem e da segurança (Couto, 2011). Se instaurou, de certa forma, os quatro tipos de territórios vislumbrados por Souza (1999): administração, circulação interna, controle e espaço dos presos. Foram projetados também mecanismos de controle e contenção da população prisional, como sala de monitoramento eletrônico e muros de separação para os pavilhões considerados mais perigosos.
A partir da década de 2010, a direção da unidade estava ainda mais comprometida com a segregação espacial dos presos, instaurando novas rotinas e divisões no espaço. Na chegada ao CPNH, os agentes de segurança deveriam fazer um mapeamento do histórico criminal do preso recém-ingresso, a fim de evitar brigas e mortes nos pavilhões (Couto, 2011). Analisavam o crime cometido, a orientação sexual, o pertencimento à gangue ou organização criminal (especialmente o PCC), bem como a existência de algum tipo de rivalidade ou guerra de rua4 com outro preso. Essas dimensões passaram a ser abordadas diretamente pelos agentes, que indagavam aos custodiados e/ou coletavam essas informações via outros setores da justiça criminal (como a Polícia Civil), sendo determinantes do lugar onde o preso passou a ser alocado. No bojo dessas transformações, os pavilhões se especializaram conforme os grupos a que pertenciam os presos (líderes do tráfico da RMBH, membros do PCC, profissionais de segurança pública etc.) e a circulação dentro da unidade se tornou mais restrita, a depender dos qualificativos de cada profissional, preso e/ou visitante da unidade.
Internamente, o espaço do CPNH se transformou em territórios de disputas: ganharam demarcações, implicando no estabelecimento de regras claras sobre quem pode ocupá-los, quem pode percorrê-los, bem como quais são as transgressões territoriais que ensejam rivalidades e interdições. Portanto, cada recorte espacial da Figura 1 conforma um microcosmo da vida prisional com a presença de diferentes atores, regras de comportamento e normas específicas de controle.
figura 1 | Planta do Complexo Penitenciário Nelson Hungria (CPNH)
Fonte: Confecção própria
Conforme os funcionários da unidade, a divisão espacial em microcárceres (Souza, 1999) é fruto das atividades de inteligência e visa evitar conflitos e rebeliões. Para garantir essa segregação espacial, a administração prisional teria reforçado as estratégias de vigilância sobre certas áreas, impedindo a interação entre presos. Contudo, os sujeitos encarcerados tendem a ser muito criativos e, não apenas redividem o já circunscrito pela administração, como tentam se apoderar de espaços onde, em tese, não deveriam ter acesso. Vejamos, então, como isso acontece.
A organização do espaço prisional
Por ser considerada uma unidade de referência em Minas Gerais e dispor de dispositivos tecnológicos de segurança, como monitoração eletrônica, body scan e guaritas de vigilância, o CPNH recebe indivíduos considerados pela justiça criminal como ameaçadores ou perigosos. Os agentes de segurança relatam um rigoroso processo de classificação na chegada dos presos, a partir de “ações de inteligência”. Nas origens da unidade, a administração se concentrava em separar os presos considerados caguetas ou X9,5 ratos de boca6 e condenados por crimes sexuais,7 evitando situações de represálias. Recentemente, a atenção dos agentes passou a ser direcionada aos presos vinculados às organizações criminais, como o PCC, e às gangues da capital (Duarte & Araújo, 2020; Ribeiro et al., 2019).
Para garantir o sucesso desse sistema classificatório, entre a chegada dos presos ao CPNH e o encaminhamento para um dos pavilhões, há diversos procedimentos. Primeiro, os agentes do Núcleo de Segurança Interna verificam o histórico criminal do preso e conversam sobre as rivalidades que ele possa ter com alguém que já cumpre pena na unidade. Esses agentes também controlam a quantidade de vagas nos pavilhões, fazem a averiguação dos perfis criminais e mantêm contato com funcionários responsáveis por atividades investigativas. Eles perguntam aos demais presos sobre o comportamento do recém-chegado, questionam sobre a sua vida e tentam verificar se a pessoa omitiu alguma informação importante em sua entrada na unidade. Durante esse tempo, o novato aguarda em um dos anexos a decisão sobre o lugar para onde será encaminhado em definitivo. Tais espaços deveriam funcionar somente como centros de triagem, mas alguns presos disseram ter permanecido mais de um ano no anexo, sendo que muitos reclamaram sobre as condições físicas desses espaços que, além de degradados, são superlotados, abrigando mais de dez pessoas por cela projetada para uma.
Ao deixar o anexo, o preso é encaminhado a um dos 12 pavilhões do CPNH. Os ligados ao PCC ficam nos pavilhões 1 e 3; os considerados chefes do tráfico encontram-se no pavilhão 2; para o pavilhão 5 são designados os que estão em guerra nas ruas ou contra internos do sistema prisional. Os condenados por crimes sexuais e os intitulados LGBTI ficam nos anexos criados especificamente para esses perfis. Todos esses grupos têm mobilidade reduzida na unidade e dispõem de contato limitado com outros custodiados que não estejam em suas alas de vivência. São rigidamente vigiados sob a narrativa de garantia da sua sobrevivência e prevenção de conflitos, sendo impossibilitados de exercer qualquer tipo de atividade laboral ou educativa.
A rotina parece ser mais rigorosa em relação aos presos identificados como pertencentes ao PCC (Duarte & Araújo, 2020). Eles só podem sair de suas celas por duas horas, sob o controle do Grupo de Intervenção Rápida (GIR) do sistema prisional,8 podendo permanecer somente no pátio dos pavilhões 1 e 3. O GIR conduz todos os procedimentos executados nesses locais, como distribuição de comida, contagem diária dos privados de liberdade, revistas pessoais e das celas, liberação dos custodiados ao banho de sol etc. Alguns poucos agentes prisionais acompanham essas tarefas, mas quem as coordena efetivamente é o grupo tático.
A despeito das diretrizes de “segurança máxima” recomendarem que os presos fiquem em confinamento solitário em suas celas, saindo da tranca apenas por breves momentos do dia, este regime parece ser relativizado para determinados atores. Por exemplo, nos pavilhões 4, 6, 10 e 11, onde se encontram os considerados presos comuns, o trânsito é livre (Ribeiro et al., 2019). O mesmo tratamento é conferido aos presos do pavilhão 12, destinado aos ex-profissionais da segurança pública, bem como aos do pavilhão H, onde estão confinados os condenados por crimes do colarinho branco e com curso superior. A flexibilização do trânsito interno é mais evidente entre os presos que trabalham, alocados nos pavilhões 7, 8 e 9, posto que eles dispõem de enorme mobilidade, especialmente os que atuam na limpeza, pintura e marcenaria, os chamados faxinas (Darke, 2014). Esses custodiados saem dos pavilhões às oito da manhã e são acompanhados por agentes penitenciários até seus locais de trabalho, onde passam o dia, retornando às celas apenas ao final da tarde. Como são considerados de bom comportamento e, consequentemente, de confiança, circulam por diferentes espaços e compartilham até as áreas exclusivas ao staff prisional.
A Figura 2 ilustra o tipo de circulação estabelecida por diferentes grupos de presos em decorrência de seus atributos, sendo que as áreas sombreadas demarcam os espaços que cada qual pode acessar. Esses mapas confirmam a tipologia de Souza (1999), sendo um ponto de partida à compreensão de como é estabelecida a delimitação espacial dentro do CPNH.
Porém, as delimitações territoriais não são necessariamente fixas, estando constantemente revisadas pelas interações entre funcionários e presos, como pressupõe Moran (2013a). Um novato pode ser encaminhado ao pavilhão de presos comuns e, em razão de seu bom comportamento, pode ser transferido ao espaço destinado aos presos faxina, podendo circular de forma mais livre na unidade. Ao revés, um preso pode se envolver em situações de conflito, quando a sua identidade de membro do PCC, escondida dos demais, é desvelada, o que ocasionaria sua transferência aos pavilhões destinados ao grupo.
figura 2 | Territórios e espaços de circulação
Fonte: Confecção própria
Não seria exagero dizer que as interações e classificações que têm lugar no CPNH refletem valores penais ambíguos. De um lado, remetem ao período de humanização vivenciado na década de 1990, posto que reforçam em alguma medida a ressocialização com o trabalho, que garante maior “liberdade” dentro da unidade. Simultaneamente, robustecem ações destinadas à dura penalização do desviante, com a transferência para espaços de regime de tranca mais severos em caso de descumprimento de regras. Para os presos vistos como recuperáveis, existe a possibilidade de trânsito entre espaços diversos, com vistas à reprodução da vida extramuros. Os mais confiáveis têm até o privilégio de circular na área exclusiva da administração prisional, onde recursos como acesso à internet e ao telefone (bastante valorizados na prisão) estão disponíveis à negociação. Em contrapartida, aqueles vistos como irrecuperáveis devem ser trancados a sete chaves, com a garantia de que vejam o sol quase que exclusivamente através do gradeado das celas. O acesso a atividades como educação e trabalho é negado a eles. Já os serviços de saúde são viabilizados em circunstâncias excepcionais ou nos casos em que a morte pode gerar conflitos na unidade.
Em resumo, tal como argumentado por Moran (2013a, p. 177), a prisão parece inerentemente “fixa” espacialmente, ao passo que os prisioneiros parecem imóveis em virtude de sua cela. Entretanto, o cotidiano prisional revela como a mobilidade é uma preocupação prática constante, tanto por parte da gestão prisional, como por parte dos presos. A localização geográfica da pessoa informa sua posição social (dentro e fora do crime) e define a possibilidade de acesso a bens e serviços, sendo determinante do raio de circulação interna e do grau de vigilância sob os passos dados dentro da unidade. Logo, a partir da análise sobre como são construídos os fluxos de circulação e os territórios demarcados na Figura 2, é possível entender como os ideais de humanização e de segregação se tornam visíveis no cotidiano do CPNH. Ambos ocupam (física e simbolicamente) espaços diferenciados dentro da prisão, com efeitos diretos na sobrevivência dos presos.
Um cenário simbiótico
Mesmo entre aqueles presos percebidos pela administração prisional (e pela justiça criminal) como mais “ameaçadores”, alguns custodiados indicaram que o CPNH seria uma das melhores experiências de privação de liberdade, especialmente, se comparado a outros locais onde já teriam cumprido pena. Em boa medida, essa percepção aparenta estar associada à tolerância aos recorrentes desvios de norma, fruto da interação entre presos e staff. É essa simbiose que conspira a favor do equilíbrio e do funcionamento da unidade prisional. Darke (2014) já chamou atenção para a falta crônica de pessoal e de estrutura vivenciada pelas prisões brasileiras, indicando que, ao mesmo tempo em que são carentes de recursos, são também lugares relativamente ordeiros. Em circunstâncias de privação material e de aguda deficiência de corpo funcional, monta-se um arremedo de normas costumeiras.
O CPNH ilustra bem essa interação. Em consequência de cortes orçamentários efetuados na área prisional em Minas Gerais nos últimos anos, reduziu-se substancialmente a verba destinada à manutenção física do estabelecimento. Alguns entrevistados chamaram a atenção para a péssima infraestrutura do local, já que o CPNH apresenta construção antiga, que não passou por reparos e manutenção ao longo dos anos. A fim de realizar algumas benfeitorias, parte do staff, em conjunto com os presos, compraram materiais de construção e recuperaram certos espaços, o que permitiu melhores condições de habitabilidade. Entretanto, como nem todos espaços da unidade prisional têm a mesma visibilidade, as benfeitorias foram concentradas nos locais mais evidentes. Os locais menos conspícuos aos olhos externos permanecem marcados por precárias condições de habitabilidade, onde os presos são submetidos ao mal cheiro e até mesmo à presença de pragas urbanas.
Em reforço a tal relação simbiótica, não são raros casos de corrupção, alguns dos quais narrados por alguns funcionários durante as entrevistas. Eles testemunharam um episódio ocorrido no segundo semestre de 2019, quando um carregamento de ketchup, coxinha9 e refrigerante, que se destinava a um grupo de presos, foi apreendido ao entrar na unidade por agentes prisionais que não participavam do esquema. Esses e outros itens ingressam regularmente na unidade graças à facilitação de funcionários penais e, posteriormente, são comercializados entre as pessoas presas. De fato, vale destacar que essa prática é desenvolvida a despeito de o Regimento de Normas Prisionais (ReNP) proibi-la expressamente.
Logo, com a adesão de alguns agentes prisionais, os presos tudo vendem: alimentos, lugar em cela, atendimento de saúde, psicossocial e jurídico, dentre outros. Alguns itens (como drogas) só estão disponíveis em determinados pavilhões, como os ocupados pelos chefes do tráfico em Belo Horizonte. O lugar do sujeito no espaço da prisão determina o acesso que ele pode ter às mercadorias legais (como itens de higiene) e ilegais (que podem incluir até celulares). Contudo, só podem comprar esses bens e serviços os que têm recursos e, para tanto, é preciso ter trabalho na unidade, contar com o apoio da família ou ter conexões com as organizações criminais. Reforça-se, assim, a perspectiva de que o espaço do CPNH reproduz as desigualdades sociais vivenciadas pelos presos fora da prisão, como argumenta Arruda (2017).
Na perspectiva de alguns informantes, o comércio interno reduz os níveis de tensão no estabelecimento, evitando motins e rebeliões, eventos que impactam toda a dinâmica carcerária (tanto os presos como a gerência administrativa). Segundo um agente prisional, os custodiados teriam percebido ser pouco estratégico rebelar-se, pois estariam confortáveis na posição atual, ocupando territórios onde são tolerados o exercício de atividades criminosas, como o uso de drogas, entre outras ações que, do ponto de vista formal, compõem o campo das ilegalidades. Eles estariam supostamente confortáveis, porque os territórios do CPNH já estavam sedimentados, do ponto de vista de quem, quando e como podem ser ocupados, não existindo disputas internas sobre eles.
Todavia, o comércio ilegal não passa despercebido pela imprensa, sendo uma das razões para a rotatividade de diretores no CPNH (Duarte & Araújo, 2020). Muitos permanecem nos cargos por apenas alguns meses, já que a publicização desses desvios tende a ocasionar a troca da administração. De todo modo, independentemente de quem esteja no comando do CPNH, permanece a simbiose entre agentes prisionais, administração e presos, onde a corrupção funciona como reguladora das relações internas e, logo, dos territórios do cárcere. Por isso, apesar de o CPNH sofrer sistematicamente interdições da justiça em razão de suas péssimas condições de privação de liberdade, não há registro de motins e rebeliões nos últimos anos.
As formas de administração do cotidiano sedimentadas pelos presos e funcionários, visíveis na organização do espaço, garantem a estabilidade do ambiente prisional. Destaque-se, ainda, como elemento inibidor de agitações a não interferência por parte dos agentes penitenciários nas disputas interpessoais e nas atividades que ocorrem dentro de cada pavilhão, fato que permite a manutenção das relações positivas (de afeto, comércio e acesso a serviços), ao contrário do que acontece em outras prisões onde as disputas pelo espaço ainda não foram firmadas e, por isso, são mais suscetíveis a conflitos que podem desaguar em motins e rebeliões que, em regra, terminam com mortes e regimes de “tranca” mais severos.
Reflexões finais
Muitas vezes a imagem pública que se tem da vida nas prisões é de um espaço constantemente inerte no qual os presos estão em uma “guerra contínua de todos contra todos” (ou de facções contra facções) ou de uma “sociedade de cativos”, que se aproximaria muito mais de mundo “atomizado” regido por um “código” informal único que regularia a convivência de todos os prisioneiros presentes em uma determinada prisão (Sykes, 1958). No entanto, com o crescimento exponencial da população prisional as prisões têm acomodado uma variedade de indivíduos, de grupos de presos, de diferentes modos de adaptação ao ambiente prisional, de diferentes “códigos” a regular o comportamento dos cativos e o desenvolvimento de estratégias distintas de sobrevivência em cada dos seus territórios de confinamento. Em determinados estabelecimentos, o preso se encontra diante de uma diversidade de ambientes sociais, geralmente organizados em “nichos” ou “clusters sociais” que são relativamente fluídos e interconectados. Sobreviver em cada um desses espaços requer um aprendizado das regras, das normas e dos valores vigentes do grupo, pois qualquer desvio grave pode ocasionar a sua morte.
O CPNH foi gradativamente organizado e estruturado espacialmente a partir do surgimento de diferentes domínios territoriais de presos, nos quais emergem diferentes formas de sociabilidade. Sua geografia carcerária indica a presença de múltiplas microterritorialidades, resultantes de complexas interações e relações de poder (Raffestin, 2008), estabelecidas entre presos, agentes prisionais e gestores da unidade prisional. Os resultados corroboram, em grande medida, a tipologia dos espaços do cárcere proposta por Souza (1999), sendo possível discernir os territórios dedicados à administração da prisão; circulação interna e controle.
Em cada um dos espaços da penitenciária são desenvolvidas estratégias de controle, de acordo com as percepções que agentes e detentos têm do “grau de periculosidade” do indivíduo com o qual estão lidando. Em cada pavilhão da unidade são mobilizados mecanismos distintos para manter a ordem, a disciplina e a segurança, acionados pela administração central e pelos próprios detentos que estão ali encarcerados. O CPNH, portanto, não se caracteriza como uma comunidade prisional uniforme, cujo espaço é ostensivamente monolítico. Existe um grau de variabilidade em seu interior, cuja expressão está nos diferentes modos de vida no interior dos pavilhões, nas condições de vida (celas solitárias ou celas coletivas), nas formas de adaptação ao ambiente prisional, na exposição dos presos a formas distintas de vigilância do seu comportamento pelos agentes penitenciários e nas demandas por lealdade requeridas pelos grupos criminosos organizados. Essas dimensões, por sua vez, determinam a forma como os fluxos dentro da própria unidade são construídos e significados por seus membros. A interação leva à constante reorganização do território, conforme observado por Arruda (2017), seja do ponto de vista da importância simbólica do interno em dinâmicas criminais (como ocorre com os líderes de gangues ou de grupos como o PCC) ou segundo os itens que cada preso possui para troca no mercado interno, o que reforça as desigualdades sociais que antecedem ao cárcere. Nesse sentido, cabe retomar Santos et al. (2000), que asseveram que o território tem forte conteúdo funcional e simbólico, representando controle físico, valor de troca, fonte de recursos e de lucro, abrigo, garantia de sobrevivência material, identidade e significados.
Estudos com o mote aqui proposto são essenciais para sanar muitos dos desafios indicados nas revisões bibliográficas, como as desenvolvidas por Adorno (1991), Salla (2006) e Lourenço e Alvarez (2018). A perspectiva proporcionada pela Geografia Carcerária permite não só reexaminar noções clássicas sobre a vida nas prisões, pouco aderentes ao ambiente penal brasileiro, como também possibilita aperfeiçoar reflexões sobre as relações de poder, que podem ser examinadas a partir de um ponto de vista ainda pouco explorado. Não tivemos a pretensão de descrever profundamente todas as variações existentes no espaço prisional, mas mostrar como a segmentação da população prisional em pavilhões específicos produziu múltiplas territorialidades e uma diversidade de modos de vida no interior da prisão. De fato, transcendendo as especificidades do CPNH, este estudo traz uma relevante contribuição ao embrionário campo de estudos da Geografia Carcerária no Brasil, em reforço, ainda, aos estudos internacionais com o mesmo mote, oferecendo uma reflexão sobre a territorialização do espaço interno de uma unidade prisional.
Agradecimentos
Os autores agradecem o apoio da FAPEMIG (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais), CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico – bolsas de produtividade em pesquisa #303733/2019-5 e #301402/2018-3) e do pesquisador Ricardo Palhares. Agradecemos também aos pareceristas anônimos que contribuíram sensivelmente para a melhoria deste texto.
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1 O Comando Vermelho é uma facção de destaque no Rio de Janeiro, que se estruturou nas prisões de Ilha Grande, inicialmente, demandando melhores condições de vida aos presos. Embora haja ambiguidades sobre essa história, a narrativa predominante indica que o grupo nasceu a partir do contato entre presos comuns e os considerados políticos pelo Regime Civil-Militar, na década de 1970 (Barbosa, 2020).
2 O PCC surgiu no sistema prisional de São Paulo em 1993. Após anos de expansão nos cárceres paulistas, a partir de 2006, o grupo teria atingido sua hegemonia nas periferias locais, sobretudo, com os atentados que comandaram em maio daquele ano. O PCC teria se consolidado não apenas em São Paulo, mas estaria em processo de difusão a várias partes do Brasil, inclusive, por Minas Gerais.
3 A Penitenciária Agrícola de Neves (PAN) foi a primeira penitenciária de Minas Gerais, construída em 1927 e inaugurada em 1939, sendo o baluarte do programa de ressocialização que marcou a história prisional do estado nas décadas passadas (Paixão, 1991). Atualmente, é denominada Penitenciária José Maria Alckmin.
4 Os presos chamam de guerras de rua as rivalidades entre grupos nos aglomerados e favelas da RMBH.
5 Presos delatores de seus pares.
6 São os que roubam objetos ou pertences de outros presos.
7 Também denominados de duzentão em referência aos números dos artigos que indexam os crimes contra a dignidade sexual no Código Penal Brasileiro.
8 Considerado o grupo de elite dos agentes prisionais, são agentes que possuem uma aparência militar, se utilizando de armas (letais ou menos letais), ostensivamente posicionadas em suas cinturas, para amedrontar e forçar os presos ao cumprimento de certas regras. Suas ações são reconhecidamente mais truculentas em comparação àquelas executadas pelos agentes prisionais em geral (Oliveira, 2018).
9 Alimento frito, salgado.
vol 49 | no 146 | enero 2023 | pp. 1-21 | artículos | ©EURE
doi: 10.7764/eure.49.146.10 | issn digital 0717-6236